Maria vai até ao quintal, onde Joana e Alice se encontram a brincar com caixotes de papelão vazios. Nenhuma delas se apercebe da chegada de Maria.
Joana
Senhora Dona Alice, olhe que temos que nos despachar para irmos ao cabeleireiro. Repare neste meu aspecto. Pareço mesmo a tia Madalena. - diz, para Alice.
Maria
Andas a ver novelas a mais. - diz, para Joana.
Maria
Alice, tens a certeza que os teus pais não se importam que tu jantes connosco? Eles nem nos conhecem! Podem ficar preocupados. Não me queres dar o número de telemóvel de um deles, para os descansar?
Alice
Não é preciso. - diz, atrapalhada e ficando com as faces vermelhas - Eu já lhes telefonei com o meu telemóvel, e expliquei tudo - tira do bolso algo que parece um telemóvel, mostra-o rapidamente a Maria e volta a colocá-lo no bolso - Eles confiam em mim. Está tudo bem.
Maria
E não queres que eu fale com eles? - insiste.
Alice
Não. Só me pediram que depois do jantar fosse logo para casa.
Joana
Depois do jantar posso ir contigo ver onde é a tua casa? - pergunta a Alice.
Alice
Não! - responde rapidamente - Depois é muito tarde, os meus pais estão cansados e não vão querer visitas. - diz depois, de uma forma mais calma.
Maria
E os teus pais trabalham no quê? - pergunta, intrigada.
Alice
São...médicos. - diz hesitante - E hoje calhou estarem os dois de serviço.
Maria
Bom. Está bem. - diz, não convencida com a conversa - Sendo assim, toca a ir para dentro lavar as mãos e sentar à mesa.
Maria volta para dentro de casa. Joana e Alice olham uma para a outra. Joana repara que algo de estranho se passa nos olhos de Alice.
Alice
Nada. Vamos arrumar isto e vamos comer. - diz, enquanto começa a agarrar em vários brinquedos espalhados pelo chão do quintal.
Joana
Espera. Em primeiro temos que desmarcar a nossa ida ao cabeleireiro. - reage, assumindo novamente a sua personagem da brincadeira - Dá-me o telemóvel que eu falo. Ele não vai gostar nada disto. - diz, enquanto tira o telemóvel do bolso de Joana, fingindo depois marcar números e falar com alguém, com o telemóvel de brincar.
Maria
Aquela Alice, parece boa moça, mas.... - deixa pendurada a frase.
Maria
Nada. Deixa.
Maria olha para o quintal, onde Alice ajuda Joana a arrumar os brinquedos. Tenta pensar em possíveis explicações para a mentira e atrapalhação de Alice.
Maria
Mostrar-me o telemóvel de brincar da minha filha, como se fosse o dela?! - diz, baixinho.
Maria
Nada! Embora chamar o José. Será que ele já acabou de montar as camas?
Madalena
Já não o ouço a dizer asneiras, há uns cinco minutos, pelo que se calhar, já vamos dormir nas nossas camas.
Entretanto chega José à cozinha com vários dedos envolvidos em pedaços de pano.
Maria
O que é que te aconteceu, amor? - diz preocupada.
José
Nada de especial. - diz orgulhoso - apenas fiz o meu trabalho de homem da casa e, graças a mim, todos temos uma cama onde merecidamente podemos repousar do dia de hoje. Foi um trabalho duro, mas compensador.
José levanta a tampa de um tacho para ver o que é o jantar.
José
Mereço por isso comer o resto da piza que sobrou do almoço. - diz, enquanto volta a pôr a tampa no tacho.
Ouve-se um ruído de algo a cair no andar de cima.
Madalena
Se o teu jeito para a bricolage se mantém, aquilo foi uma das camas a desmoronar-se e com ela, a remota possibilidade de comeres outra coisa, que não o belo jantar que eu e a tua mulher preparámos.